Chovia muito naquela noite de novembro e John William Morris olhava pela janela, pensando no quanto seus estudos poderiam se tornar importantes para o mundo, quando ficasse comprovado que ele, o herdeiro de uma das maiores fortunas do planeta, havia descoberto a cura para a doença mais terrível conhecida pelo homem.
O câncer sempre causara na humanidade o temor pela morte. Uma das doenças mais antigas a qual o homem tomou conhecimento, o câncer não teve uma cura realmente eficiente encontrada mesmo após muitos anos de pesquisa especifica. Todos os tratamentos existentes exigiam muito do paciente e, muitas vezes, causavam efeitos tão indesejáveis como a própria doença. No entanto, quem estava doente se via obrigado a agarrar estas oportunidades, pois eram as únicas chances de sobreviver.
Agora ele poderia dizer ao mundo e, o mais importante, a si mesmo que sua vida valia a pena. Perdera uma pessoa de extrema importância em sua vida para o câncer e a partir de então se dedicou totalmente às pesquisas, procurando por respostas e por uma cura que realmente trouxesse de volta a saúde de quem estava sendo tratado.
Começou procurando pelo caminho inverso. Ao invés de tentar entender como curar o câncer, ele procurou por soluções utilizadas e que não deram certo. Assim ele poderia restringir suas buscas ao que ainda não fora tentado. Num segundo momento procurou entender totalmente o motivo que levava um corpo saudável a gerar tumores muitas vezes fatais. Após concluir que alterações genéticas, mutações dos genes naturais do corpo humano, causavam a multiplicação das células defeituosas, entendeu que o tratamento mais adequado para o quadro clínico de multiplicação celular defeituoso seria reajustar, por meio de engenharia genética, os genes responsáveis, a fim de que eles não saíssem do controle.
Seu método consistiria em reprogramá-los de modo que a multiplicação acelerada e defeituosa fosse parada a tempo, antes que o câncer se alastrasse pelo corpo, causando danos irreversíveis à saúde dos doentes. Por anos procurou meios para fazer com que sua tese se tornasse mais do que um estudo teórico e então, quando recebeu autorização especial das agencias governamentais para iniciar o estudo prático, percebeu que a resposta estava mais visível do que ele mesmo poderia imaginar.
Se a necessidade era reprogramar células, o mais importante seria que essas células pudessem ser totalmente compatíveis com o paciente que as receberia. Então, em uma inovadora técnica de engenharia biogênica, o Dr. Morris conseguiu transformar células-tronco de pacientes doentes em células sadias e, após modificar as instruções gênicas contidas nelas, reimplantá-las no local doente. O processo era lento e difícil e muitas vezes o corpo não respondia de forma satisfatória. No entanto, após algum tempo, as células implantadas começavam a comandar ações de defesa do organismo e a substituir as células doentes.
Com o passar das horas, o controle da multiplicação celular estava totalmente sob o domínio das células implantadas, que por serem sadias evitavam o desenvolvimento e a proliferação da doença no corpo.
Em menos de dez dias, o paciente não apresentava mais qualquer tipo de comportamento celular anormal e podia se dizer que estava curado. O tumor que havia se desenvolvido anteriormente à aplicação das células sadias era removido cirurgicamente e a vida voltaria a ser vivida de forma natural.
Procurou por grandes empresas da área da farmacêutica moderna, esperando encontrar apoio para suas descobertas. Ele, por si só não poderia levantar os recursos necessários para que a reprodução do método fosse feita de forma mundial, visando à cura dos milhões de pacientes com câncer no mundo.
No entanto não poderia imaginar que as reações seriam tão diferentes do que ele esperava. Apesar dos gastos crescentes dos governos com os tratamentos feitos aos doentes, não era conveniente aos grandes nomes do mercado internacional que fosse oferecida uma solução barata e rápida para o problema. O ponto de conflito era que o lucro gerado pela indústria era muito maior do que o possível lucro que seria acarretado pelo lançamento mundial da cura.
Morris, contrariado e totalmente desiludido com o egoísmo vigente no mercado, decidiu que o melhor seria divulgar suas descobertas abertamente, deixando que a pressão pública servisse de ferramenta para que o estudo fosse continuado e repetido pelo mundo. Entrou em contato com as grandes universidades e com os meios de comunicação mais influentes do planeta, para demonstrar que estava disposto a ceder gratuitamente suas descobertas.
Poucas horas depois do primeiro anuncio oficial de que a cura fora descoberta, os maiores sites de busca do mundo mostravam o interesse público no assunto. Os canais de televisão do mundo todo procuravam entrar em contato com um John bastante satisfeito e feliz. Afinal conseguira provar que a solução estava ali.
Percebendo o grande erro que cometeram ao negar apoio ao projeto, as grandes empresas se apressaram a procurá-lo, com ofertas maravilhosas, de valores que talvez convencessem qualquer um. Mas John Morris tinha um sonho, um desejo e a sua luta se tornou mais difícil ao negar publicamente aos pedidos e ofertas pela tecnologia da cura do câncer.
Disse que o estudo seria entregue gratuitamente, desde que fosse provado legalmente que dele não resultariam lucros de qualquer tipo. Recusou-se a dar entrevistas para os meios sensacionalistas e por fim se viu isolado do mundo, procurando pela paz que perdera ao entregar seus sonhos ao mundo.
Mas esse não era o único projeto em que ele estava trabalhando e parecia haver pessoas que sabiam demais em seu meio. Sua pesquisa maior e mais importante não seria divulgada e ele a defenderia a todo custo.
Logo o mundo perceberia que ele era mais do que um cientista louco.
E então, após perceber que seus pensamentos iam longe demais, ele procurou deixá-los de lado e voltar à realidade.
Tinha que apresentar os estudos para uma grande equipe de cientistas e mesmo assim não se sentia seguro. Decidiu então voltar ao trabalho quando o telefone tocou.
- William Morris?
- Sim.
- Sabemos o que está fazendo por baixo dos panos e temos interesse em garantir que toda descoberta seja de exclusiva exploração de nossa empresa. Diga seu preço e será pago.
- Não sei do que você fala. E alem do mais, não preciso de dinheiro.
- Talvez dinheiro não seja o problema, realmente. Mas todos têm um preço. E você sabe exatamente do que se trata. O projeto Broken Life está ativo novamente, não está?
- Como sabe deste projeto? E quem é você?
- Realmente pensa que seus passos não podem ser ouvidos, doutor? Estamos em todos os lugares.
- Me diga seu nome, maldito!
E então o silencio se fez presente e ele percebeu que novamente se deixara acuar pela simples citação do nome do antigo projeto.
Seus pensamentos eram feitos de um misto de medo e raiva, por lembrar-se dos acontecimentos que sucederam o inicio daquele projeto. Tudo podia ter sido colocado a perder por demonstrar, mesmo de forma indireta, que ele reativara o projeto.
Ouviu a voz de uma mulher e quando se virou, percebeu que havia uma grande arma apontada para seu peito. Deu um passo em direção a seu atacante e então sentiu o cartucho ser disparado, o cheiro da pólvora tomando conta do ambiente e então a dor, a terrível dor que ele estava quase se habituando a sentir.
Quando morria novamente, acordou.
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